Coast to Coast
"Escrever é usar as palavras que se guardaram: se tu falares de mais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer." [M.S.T.]
25.7.09
21.7.09
Aprendemos a falar de amor quando não havia mais nada entre nós. Quando a cumplicidade da amizade se tornou mais forte. Aprendemos a falar de amor porque não havia nada para esquecer, nenhum sentimento pronto a nascer. Aprendemos a falar de amor no silêncio entre uma gargalhada e outra. Aprendemos a falar sobre o nosso amor a partir do momento que ele desapareceu. Só aprendemos a falar do amor, depois de o fazer. Só aprendemos a falar de amor depois do sol se pôr e ser hora de partir.
8.
Eva querida, custa-me pouco dizer-te que estás profundamente enganada. Eu sei amar. Todos sabemos. De formas diferentes e coisas diferentes.
Eu amo a Vida! Na sua essência, na sua pureza, na ingenuidade suprema de novidade. Amo o Mundo que existe sem porquês, a Natureza que ressoa num véu de seda concreto, amo o real na temporalidade da memória nunca extraviada.
Vou amando. Porque não sou egoísta como tu, que foste capaz de construir o teu universo à medida do Afonso.
O meu amor não é assim. Exclusivo, pormenorizado, inseguro, mascarado, passional e desalmado. Trata-se de um sentimento mais abrangente. Indefinido, afirmado, discreto e colonial. Eu sei que jamais entenderás os sentimentos que acreditas que não tenho. És imatura apesar de já teres tido todos os motivos para crescer. Serás eternamente uma bailarina sem palco e com talento. Eva, Eva, és tão importante para mim que por vezes imploro aos deuses para que te sintas fragilizada e voando até ao meu apartamento me faças tropeçar nas tuas desilusões patéticas e encantadoras.
Não sei ser-te indiferente. Não consigo. Nem sequer quero aprender. A tua vida dava um filme. A minha uma curta-metragem. Trazes às costas o peso de um amor inexplicável e sombrio, que te vai iluminando os caminhos de forma imprudente e abissal. Fazes amigos como quem cultiva um jardim de rosas e malmequeres. E depois abandona-los até à próxima crise existencial e brutal que te consome energias e te arrecada frustrações. Entras nas nossas vidas como se fosses um elixir e vicias-nos sem piedade. Desapareces no teu mundo e refugias-te por detrás de tulipas coloridas e apáticas. Contrarias a solidão que tanto temes com músicas celestiais e surdas.
Chegas até mim quando a tristeza é superior à alegria que irradias confusa. E choras incessantemente até que a insegurança se esgote.
És um anjo. O meu anjo. Eva. Nunca me abandones. Sem ti a sombra do nada voltará a pairar na vida que tanto amo e da qual me orgulho e desregulo sem pensar. Sem ti o frio das noites e do meu coração torna-se insuportável. Sem ti as estrelas esmagam-me e segregam choros violados. Sem ti a aspereza da minha boca sussurra e vagueia sem sono nem sonhos por jardins sombrios. Sem ti sou um amigo tresmalhado e derrotado. Sem ti sou nada. Sem ti nada sou.
Eu amo a Vida! Na sua essência, na sua pureza, na ingenuidade suprema de novidade. Amo o Mundo que existe sem porquês, a Natureza que ressoa num véu de seda concreto, amo o real na temporalidade da memória nunca extraviada.
Vou amando. Porque não sou egoísta como tu, que foste capaz de construir o teu universo à medida do Afonso.
O meu amor não é assim. Exclusivo, pormenorizado, inseguro, mascarado, passional e desalmado. Trata-se de um sentimento mais abrangente. Indefinido, afirmado, discreto e colonial. Eu sei que jamais entenderás os sentimentos que acreditas que não tenho. És imatura apesar de já teres tido todos os motivos para crescer. Serás eternamente uma bailarina sem palco e com talento. Eva, Eva, és tão importante para mim que por vezes imploro aos deuses para que te sintas fragilizada e voando até ao meu apartamento me faças tropeçar nas tuas desilusões patéticas e encantadoras.
Não sei ser-te indiferente. Não consigo. Nem sequer quero aprender. A tua vida dava um filme. A minha uma curta-metragem. Trazes às costas o peso de um amor inexplicável e sombrio, que te vai iluminando os caminhos de forma imprudente e abissal. Fazes amigos como quem cultiva um jardim de rosas e malmequeres. E depois abandona-los até à próxima crise existencial e brutal que te consome energias e te arrecada frustrações. Entras nas nossas vidas como se fosses um elixir e vicias-nos sem piedade. Desapareces no teu mundo e refugias-te por detrás de tulipas coloridas e apáticas. Contrarias a solidão que tanto temes com músicas celestiais e surdas.
Chegas até mim quando a tristeza é superior à alegria que irradias confusa. E choras incessantemente até que a insegurança se esgote.
És um anjo. O meu anjo. Eva. Nunca me abandones. Sem ti a sombra do nada voltará a pairar na vida que tanto amo e da qual me orgulho e desregulo sem pensar. Sem ti o frio das noites e do meu coração torna-se insuportável. Sem ti as estrelas esmagam-me e segregam choros violados. Sem ti a aspereza da minha boca sussurra e vagueia sem sono nem sonhos por jardins sombrios. Sem ti sou um amigo tresmalhado e derrotado. Sem ti sou nada. Sem ti nada sou.
20.7.09
7.
Começo a achar estranhas, mesmo inoportunas as atitudes do Tomás. Se continuar assim vou ter de acabar o nosso relacionamento. Eu gosto dele, mas estes ciúmes exagerados transfiguram-no. Como se fosse um mutante.
Chama-me "princesa russa". Como se eu fosse fria, imprevisível e fatal. Olha-me com uns olhos belos mas vidrados. Fissurados. Parece que me intersecta e me craveja com palavras indestrutíveis e despropositadas.
Acreditei que ia ser feliz ao seu lado. Mas já não tenho tanta certeza. E depois há esta proposta de trabalho no Brasil e quero partir sozinha.
Está decidido. Amanhã vou por um ponto final na minha história com o Tomás. Sem espaço para reticências, nem interrogações. È uma decisão firme, sem espaço para ilusões e discórdia. Acabou. Como sempre. A Maria Eduarda tinha razão. O fim era o limite.
Por quais razões duram tão pouco as minhas paixões quentes e irrepetíveis? Porque motivo só consegui amar o Afonso?
Porque é cómodo. Mais doloroso, mas não precisa de muito esforço. Amo o Afonso porque ele está a anos-luz de ser meu. Amei-o e acabou tudo. Sem porquês, nem intrigas. Sem divisão de camas, nem de casas, nem de manhãs, muito menos de noites. Momentos. Só partilhamos momentos, protecção e amor. Nada mais. Amei-o na simplicidade dos sentimentos paralelos, que na perpendicularidade da vida se tornaram insignificantes. Amei-o em plena juventude, numa explosão de sensações que reflectiam o céu e o mar numa progressiva exaltação de cor. Amei-o sem roupa e sem dinheiro. Mendigo de amor e de pão. Senhor do meu coração. Amei-o.
E agora o Tomás. Saiu e entrou na minha vida da mesma forma. Sem fazer ruído. Sem causar emoções fortes nem fracas. Entrou em silêncio e assim partirá. Não há história. Só palavras desafinadas e urbanas que memorizarei por pouco tempo. É sempre assim. Só o Afonso se manteve e manterá no meu coração. Feliz ou infelizmente.
E choro. Não sei se é defeito ou feito mas sempre chorei demais. Quando tinha motivo e quando não encontrava nenhum motivo para chorar. Quando sentia falta do Afonso ou quando tinha medo de nunca mais sentir falta de ninguém. Quando estava sozinha ou quando acompanhada tinha medo da solidão. Medo. Tenho medo a mais. Recuo no amor como quem recua numa batalha para não perder a guerra. Tenho tanto medo de amar a vida que só amo o Afonso. A mágoa desordenada de que me aproximo e me atraio ensinou-me a morrer sem medo. Só não tenho medo da morte. Ao contrário do Francisco.
Conheci-o trémulo, impiedoso, intimista e transtornado. Um misto de força e de fraqueza. Um fertilizador de amizades e sabedoria. Um filósofo pacifista e educado. Um professor de Português que apenas me ensinou a ser feliz.
Ele tem medo de morrer. Eu de viver. Assusta-o a agressividade dos homens e a mística que envolve Aquele Outro Mundo. O Paraíso. Não há provas e o Francisco só acredita naquilo que vê. Convencido e (des)crente, ele não atina com a palavra "Adeus". Nunca percebi se acredita ou não em Deus. Apenas sei que acredita na vida. Porque a sente, a explora, a narra, a amplifica. O Francisco é o meu melhor amigo. Mais na infelicidade do que na alegria. Sinto-me protegida ao seu lado. Abraça-me porque duvida. E eu gosto da sua incerteza quanto à minha futura independência do mundo.
Não gosto de estar sozinha porque aprendi a ter o Francisco ao meu lado. Recuperado e realista. Um falador de silêncios. Um perpétuo guardador de segredos. O Francisco.
Fala com os olhos verdadeiros e febris. Critica-me com a doçura que a intimidade veemente acalenta. Beija-me a alma porque tem medo do meu espírito. Persegue os meus sonhos e sem compaixão apaga o Afonso para que eles sejam perfeitos. Como se eu alguma vez conseguisse atingir a fímbria da perfeição sem o amor imoral e infinito que sinto por ele.
Francisco, às vezes acho que nunca amaste ninguém. Tenho certeza. Quem ama acredita. Quem ama não discute com força. Quem ama vê com a nitidez difusa e colorida do amor. Quem ama imortaliza a paixão e protege a recompensa imperecível dos triunfos do coração.
Conheces-me tão bem, mas tão pouco. Sabes do Afonso, dos meus segredos cúmplices e simples, da morte que anseio e não receio, da vida que mal vivi e que vivi mal. Conheces-me as aparências físicas e internas e não és capaz de entender o que significa a palavra Amor. Na sua simplicidade encantada, arrebatadora e sincera.
Recusas a morte com paixão e não consegues apaixonar-te por ninguém. Como se fosses superior aos sentimentos. Como se só a eloquência e a arrumação de vida fizessem sentido.
Não sabes nada de nada e sabes tudo. Invejo-te e odeio-te. Porque te adoro. Adoro-te o sorriso meigo e cansado dos dias em que tenho medo de sair do teu lado. Adoro o cheiro do incenso que espalhas pela casa para que tudo seja mais difuso e acolhedor. Adoro a sombra inquieta do teu coração sem dono. Adoro sentir as tuas mãos nos meus cabelos desgrenhados e molhados pelas lágrimas incessantes dos pensamentos que teimam em abraçar o Afonso. Adoro-te. Com uma leveza que pesa e não cansa.
Nunca me apaixonei por ti. Só pelo carinho e companhia que sei que sempre me farás.
Adoro-te. Muito. Muito. Muito.
Chama-me "princesa russa". Como se eu fosse fria, imprevisível e fatal. Olha-me com uns olhos belos mas vidrados. Fissurados. Parece que me intersecta e me craveja com palavras indestrutíveis e despropositadas.
Acreditei que ia ser feliz ao seu lado. Mas já não tenho tanta certeza. E depois há esta proposta de trabalho no Brasil e quero partir sozinha.
Está decidido. Amanhã vou por um ponto final na minha história com o Tomás. Sem espaço para reticências, nem interrogações. È uma decisão firme, sem espaço para ilusões e discórdia. Acabou. Como sempre. A Maria Eduarda tinha razão. O fim era o limite.
Por quais razões duram tão pouco as minhas paixões quentes e irrepetíveis? Porque motivo só consegui amar o Afonso?
Porque é cómodo. Mais doloroso, mas não precisa de muito esforço. Amo o Afonso porque ele está a anos-luz de ser meu. Amei-o e acabou tudo. Sem porquês, nem intrigas. Sem divisão de camas, nem de casas, nem de manhãs, muito menos de noites. Momentos. Só partilhamos momentos, protecção e amor. Nada mais. Amei-o na simplicidade dos sentimentos paralelos, que na perpendicularidade da vida se tornaram insignificantes. Amei-o em plena juventude, numa explosão de sensações que reflectiam o céu e o mar numa progressiva exaltação de cor. Amei-o sem roupa e sem dinheiro. Mendigo de amor e de pão. Senhor do meu coração. Amei-o.
E agora o Tomás. Saiu e entrou na minha vida da mesma forma. Sem fazer ruído. Sem causar emoções fortes nem fracas. Entrou em silêncio e assim partirá. Não há história. Só palavras desafinadas e urbanas que memorizarei por pouco tempo. É sempre assim. Só o Afonso se manteve e manterá no meu coração. Feliz ou infelizmente.
E choro. Não sei se é defeito ou feito mas sempre chorei demais. Quando tinha motivo e quando não encontrava nenhum motivo para chorar. Quando sentia falta do Afonso ou quando tinha medo de nunca mais sentir falta de ninguém. Quando estava sozinha ou quando acompanhada tinha medo da solidão. Medo. Tenho medo a mais. Recuo no amor como quem recua numa batalha para não perder a guerra. Tenho tanto medo de amar a vida que só amo o Afonso. A mágoa desordenada de que me aproximo e me atraio ensinou-me a morrer sem medo. Só não tenho medo da morte. Ao contrário do Francisco.
Conheci-o trémulo, impiedoso, intimista e transtornado. Um misto de força e de fraqueza. Um fertilizador de amizades e sabedoria. Um filósofo pacifista e educado. Um professor de Português que apenas me ensinou a ser feliz.
Ele tem medo de morrer. Eu de viver. Assusta-o a agressividade dos homens e a mística que envolve Aquele Outro Mundo. O Paraíso. Não há provas e o Francisco só acredita naquilo que vê. Convencido e (des)crente, ele não atina com a palavra "Adeus". Nunca percebi se acredita ou não em Deus. Apenas sei que acredita na vida. Porque a sente, a explora, a narra, a amplifica. O Francisco é o meu melhor amigo. Mais na infelicidade do que na alegria. Sinto-me protegida ao seu lado. Abraça-me porque duvida. E eu gosto da sua incerteza quanto à minha futura independência do mundo.
Não gosto de estar sozinha porque aprendi a ter o Francisco ao meu lado. Recuperado e realista. Um falador de silêncios. Um perpétuo guardador de segredos. O Francisco.
Fala com os olhos verdadeiros e febris. Critica-me com a doçura que a intimidade veemente acalenta. Beija-me a alma porque tem medo do meu espírito. Persegue os meus sonhos e sem compaixão apaga o Afonso para que eles sejam perfeitos. Como se eu alguma vez conseguisse atingir a fímbria da perfeição sem o amor imoral e infinito que sinto por ele.
Francisco, às vezes acho que nunca amaste ninguém. Tenho certeza. Quem ama acredita. Quem ama não discute com força. Quem ama vê com a nitidez difusa e colorida do amor. Quem ama imortaliza a paixão e protege a recompensa imperecível dos triunfos do coração.
Conheces-me tão bem, mas tão pouco. Sabes do Afonso, dos meus segredos cúmplices e simples, da morte que anseio e não receio, da vida que mal vivi e que vivi mal. Conheces-me as aparências físicas e internas e não és capaz de entender o que significa a palavra Amor. Na sua simplicidade encantada, arrebatadora e sincera.
Recusas a morte com paixão e não consegues apaixonar-te por ninguém. Como se fosses superior aos sentimentos. Como se só a eloquência e a arrumação de vida fizessem sentido.
Não sabes nada de nada e sabes tudo. Invejo-te e odeio-te. Porque te adoro. Adoro-te o sorriso meigo e cansado dos dias em que tenho medo de sair do teu lado. Adoro o cheiro do incenso que espalhas pela casa para que tudo seja mais difuso e acolhedor. Adoro a sombra inquieta do teu coração sem dono. Adoro sentir as tuas mãos nos meus cabelos desgrenhados e molhados pelas lágrimas incessantes dos pensamentos que teimam em abraçar o Afonso. Adoro-te. Com uma leveza que pesa e não cansa.
Nunca me apaixonei por ti. Só pelo carinho e companhia que sei que sempre me farás.
Adoro-te. Muito. Muito. Muito.
18.7.09
6.
Namoro com uma super mulher. Super miúda, melhor dizendo. Nunca pensei que pudesse encontrar uma mulher com o sorriso meigo da Julia Roberts, o cabelo esvoaçante da Catherine Zeta-Jones, os olhos perfumados da Katie Blanch, o corpo encantado da Marilyn Monroe e a sensualidade surreal da Angelina Jolie. Tudo para mim. Não é que ache que não mereço, mas por vezes custa-me a acreditar que a Eva é minha namorada.
Os meus amigos invejam-me e até eu tenho ciúmes de mim. A imprensa explora o assunto muito além dos limites. "Tomás Albuquerque encontrou o Amor". "Jovem mistério ao lado de Tomás". "Jornalista vive paixão tórrida".
Sou o homem do ano. A Eva causou um impacto gigantesco. Tenho o mundo e a mulher mais atraente que alguma vez conheci aos meus pés. Fama, dinheiro, beleza, sucesso. Tudo gira à minha volta protegendo-me do fulgor desconcertante da cruel realidade e pobreza. Vivo num universo de sonho que criei para esquecer o passado. A dor de filho rejeitado e alheado. Uma existência perigosa e negada. Ao ponto de calar a fúria da morte da minha mãe.
Em toda a minha vida, só conheci o meu pai, que não me tratou mal. Nem bem. Era-lhe indiferente. Desapareceu quando eu tinha cinco anos e nunca mais tive notícias dele.
Vivi num orfanato. Estudei. Lutei pelo meu futuro e fui um brilhante aluno. Ou um aluno brilhante. Formei-me em Ciências da Comunicação e toda a gente me vê como um homem feliz. Realizado.
Cresci sem afecto. Nunca senti carinho por ninguém. Só agora pela Eva.
O passado faz-me sangrar. Muitíssimo. É uma discreta aflição transparente na sua opacidade que eu quero esquecer para viver serenamente.
Não tenho sossego. Sou um homem de aparências, de estratégias, que jamais perdoará a infame infância que lhe foi destinada.
Nenhuma criança tem o direito de sofrer tanto. De morrer espiritualmente na chuva das lágrimas que derramou sozinho.
Tenho a Eva agora. Para sempre. É a mulher da minha vida. A mulher da vida de qualquer homem. Mas foi a mim que ela escolheu para percorrer as passerelles imaginárias em que desfila fervente. Batem-lhe palmas como se fosse uma princesa russa de alma confessa e aromática. Esta mulher é só minha.
Calem os espíritos e cessem os pensamentos. Não sonhem com o que não podem ter. A ignorância de que vos pautais não seduzirá nunca a Eva. Ela gosta de homens inteligentes e cultos, que não têm medo de balbuciar de madrugada a palavra Amo-te.
A Eva nunca me irá deixar. Ela ama-me. Só a mim. Tenho a certeza disso. Eu vou ser o pai dos filhos dela. Ancorou no meu mundo e em momento algum zarpará.
Os meus amigos dizem que estou a ficar obcecado. Mas é mentira. Tenho os objectivos bem definidos. Só isso. Alimento somente este amor compulsivo pela Eva. Preciso de gerir bem a fragilidade da minha vida impertinente. Sou eu e não sou. Sinto e não acredito. Torno-me alvorado e homenageio a Eva em catadupa. Como se ela me regesse. Como se a promiscuidade do meu ser combatesse os sentidos iludidos de que me vou cercando.
Estou louco. De amor pela Eva. Incendiou a ingenuidade cruel que me compunha, numa perversa brincadeira de paixões.
Venero-a.
Rainha guerreira de espada cor de sangue que bailas no meu pensamento, desce desse pedestal onde me intimidas e mata-me de paixão.
Aceito morrer em tuas sublimes e cruéis mãos. Não me poupes a vida, não. Mata-me por vaidade não por piedade. Derrama o meu sangue e alimenta a tua alma insana. Desfia o meu corpo pulsante e apedreja os meus olhos que te alcançam e inspiram. Faz o que tem de ser feito, moribunda que circundas e lapidas os órgãos que me pertencem. Sou teu até ao fim.
Gamaste-me o coração e só tenho para te oferecer a rebeldia e loucura dos dias que me faltam viver. Dos dias que me faltam morrer.
Eva, porque me possuis e assassinas tão devagar?
Os meus amigos invejam-me e até eu tenho ciúmes de mim. A imprensa explora o assunto muito além dos limites. "Tomás Albuquerque encontrou o Amor". "Jovem mistério ao lado de Tomás". "Jornalista vive paixão tórrida".
Sou o homem do ano. A Eva causou um impacto gigantesco. Tenho o mundo e a mulher mais atraente que alguma vez conheci aos meus pés. Fama, dinheiro, beleza, sucesso. Tudo gira à minha volta protegendo-me do fulgor desconcertante da cruel realidade e pobreza. Vivo num universo de sonho que criei para esquecer o passado. A dor de filho rejeitado e alheado. Uma existência perigosa e negada. Ao ponto de calar a fúria da morte da minha mãe.
Em toda a minha vida, só conheci o meu pai, que não me tratou mal. Nem bem. Era-lhe indiferente. Desapareceu quando eu tinha cinco anos e nunca mais tive notícias dele.
Vivi num orfanato. Estudei. Lutei pelo meu futuro e fui um brilhante aluno. Ou um aluno brilhante. Formei-me em Ciências da Comunicação e toda a gente me vê como um homem feliz. Realizado.
Cresci sem afecto. Nunca senti carinho por ninguém. Só agora pela Eva.
O passado faz-me sangrar. Muitíssimo. É uma discreta aflição transparente na sua opacidade que eu quero esquecer para viver serenamente.
Não tenho sossego. Sou um homem de aparências, de estratégias, que jamais perdoará a infame infância que lhe foi destinada.
Nenhuma criança tem o direito de sofrer tanto. De morrer espiritualmente na chuva das lágrimas que derramou sozinho.
Tenho a Eva agora. Para sempre. É a mulher da minha vida. A mulher da vida de qualquer homem. Mas foi a mim que ela escolheu para percorrer as passerelles imaginárias em que desfila fervente. Batem-lhe palmas como se fosse uma princesa russa de alma confessa e aromática. Esta mulher é só minha.
Calem os espíritos e cessem os pensamentos. Não sonhem com o que não podem ter. A ignorância de que vos pautais não seduzirá nunca a Eva. Ela gosta de homens inteligentes e cultos, que não têm medo de balbuciar de madrugada a palavra Amo-te.
A Eva nunca me irá deixar. Ela ama-me. Só a mim. Tenho a certeza disso. Eu vou ser o pai dos filhos dela. Ancorou no meu mundo e em momento algum zarpará.
Os meus amigos dizem que estou a ficar obcecado. Mas é mentira. Tenho os objectivos bem definidos. Só isso. Alimento somente este amor compulsivo pela Eva. Preciso de gerir bem a fragilidade da minha vida impertinente. Sou eu e não sou. Sinto e não acredito. Torno-me alvorado e homenageio a Eva em catadupa. Como se ela me regesse. Como se a promiscuidade do meu ser combatesse os sentidos iludidos de que me vou cercando.
Estou louco. De amor pela Eva. Incendiou a ingenuidade cruel que me compunha, numa perversa brincadeira de paixões.
Venero-a.
Rainha guerreira de espada cor de sangue que bailas no meu pensamento, desce desse pedestal onde me intimidas e mata-me de paixão.
Aceito morrer em tuas sublimes e cruéis mãos. Não me poupes a vida, não. Mata-me por vaidade não por piedade. Derrama o meu sangue e alimenta a tua alma insana. Desfia o meu corpo pulsante e apedreja os meus olhos que te alcançam e inspiram. Faz o que tem de ser feito, moribunda que circundas e lapidas os órgãos que me pertencem. Sou teu até ao fim.
Gamaste-me o coração e só tenho para te oferecer a rebeldia e loucura dos dias que me faltam viver. Dos dias que me faltam morrer.
Eva, porque me possuis e assassinas tão devagar?
17.7.09
5.
A Eva encontrou o Afonso à porta de minha casa e a esta hora não teve ainda uma daquelas recaídas que têm tanto de imanente como de natural. Estranho. Estará ela a recuperar de nove anos de tristeza moribunda e desumana? Não me parece. Deve ser apenas o resultado de alguma dose terminável de auto-convencimento de que o Afonso é do mundo e não dela.
Pareceu-me desejosa e sorridente. Uma Eva comum na sua singularidade e exclusiva no tom de violeta da sua alma. Sonhará ela com a possibilidade – remota – do Afonso a amar como ela há tanto anseia? Disso é ela capaz. De alimentar esperanças falsas e impuras que a fazem acreditar e viciar a sua inteligência. Valiosa e conformista, a Eva ganha pontos no amadorismo dos seus sentimentos. Ela é uma óptima prima, não uma boa amante. Não sabe amar na sanidade que o amor radiante estipula.
Contaminou a própria vida com o cadáver dançante de um Afonso que a consome e a visita inesperadamente. O cheiro da campa lacrimeja tudo em seu redor. A Eva não será a mesma sem esse odor a mortandade romântica e amarrotada. Ela não matou o Afonso. Embalsamou-o de uma forma errada e pegajosa.
E agora dança. Com um morto pendurado no coração e os encontros fugazes com a vivacidade desse homem que o Gui e eu adoramos. Dança. Maravilha as circunstâncias e os espectadores descabelados e contemporâneos que a invejam e admiram.
Está morta para o Afonso e muito viva para os amigos. Ela vive. Foi aprendendo a viver. Como se fosse um bebé e tivesse de utilizar pela primeira vez as pernas como meio locomotor simples e saudável. Eu ensinei-lhe tudo o que sabia e ainda mais para a transformar numa mulher forte e segura. E ela continua a mergulhar na resignação e no ressentimento.
A orientação terapêutica baseada na amizade que tão carinhosamente lhe facultei revelou-se incapaz. Ineficaz. Confesso isto ouvindo os gritos de dor do meu desassossego. Os uivos estridentes da minha falha. Da falta equiparável que a Eva me vai fazer quando partir sozinha para o Brasil.
Pareceu-me desejosa e sorridente. Uma Eva comum na sua singularidade e exclusiva no tom de violeta da sua alma. Sonhará ela com a possibilidade – remota – do Afonso a amar como ela há tanto anseia? Disso é ela capaz. De alimentar esperanças falsas e impuras que a fazem acreditar e viciar a sua inteligência. Valiosa e conformista, a Eva ganha pontos no amadorismo dos seus sentimentos. Ela é uma óptima prima, não uma boa amante. Não sabe amar na sanidade que o amor radiante estipula.
Contaminou a própria vida com o cadáver dançante de um Afonso que a consome e a visita inesperadamente. O cheiro da campa lacrimeja tudo em seu redor. A Eva não será a mesma sem esse odor a mortandade romântica e amarrotada. Ela não matou o Afonso. Embalsamou-o de uma forma errada e pegajosa.
E agora dança. Com um morto pendurado no coração e os encontros fugazes com a vivacidade desse homem que o Gui e eu adoramos. Dança. Maravilha as circunstâncias e os espectadores descabelados e contemporâneos que a invejam e admiram.
Está morta para o Afonso e muito viva para os amigos. Ela vive. Foi aprendendo a viver. Como se fosse um bebé e tivesse de utilizar pela primeira vez as pernas como meio locomotor simples e saudável. Eu ensinei-lhe tudo o que sabia e ainda mais para a transformar numa mulher forte e segura. E ela continua a mergulhar na resignação e no ressentimento.
A orientação terapêutica baseada na amizade que tão carinhosamente lhe facultei revelou-se incapaz. Ineficaz. Confesso isto ouvindo os gritos de dor do meu desassossego. Os uivos estridentes da minha falha. Da falta equiparável que a Eva me vai fazer quando partir sozinha para o Brasil.
16.7.09
4.
A Eva nunca vai abandonar a ilusão que lhe sorri, sisuda, do Afonso. Disso tenho uma secreta certeza. Ela é uma mulher perfeita nas suas imperfeições, uma falsa feminista, que luta pelos ideais das mulheres e não consegue ver-se livre de um homem. Aprisionou-se a ele cheia de certezinhas absolutas do seu amor e perdeu. Perdeu-se na discreta e abstracta mediocridade de um Afonso que tem medo de amar.
Viciei-me nela. Não posso negar. Viciei-me nas lágrimas pacíficas que derrama no sofá da minha casa porque nunca aprendeu a ser infeliz sozinha. Viciei-me nos gestos alinhados e vivos dos seus dedos enigmáticos. Viciei-me na sua vida povoada de príncipes e princesas, de fadas invisíveis e bailarinas sumptuosas.
Ela é uma criança. Uma mulher que quer para sempre ter quinze anos. Essa idade liga-a ao passado e, por conseguinte, ao homem que tão delicadamente a decompõe numa tristeza estereofónica e medíocre.
Ela inspira-me. Inspira a minha vida esborratada e deserta. Uma vida que não magoa, mas fere.
A Eva ressuscitou-me. Ajustei a minha existência à dela e não conseguirei em momento algum desprender-me deste deslumbramento gentilmente cedido por um eventual e altruísta Destino.
Amansou-me a idade e o espírito. Já não tenho medo de envelhecer, de morrer. A morte torturava-me e a Eva oferece-me o alívio dos afectos e do choro alheado que eu não pressenti nem causei. Ela vive em constante remodelação interior e não é capaz de enterrar o seu maior inimigo.
Adquiriu todas as habilidades necessárias e fundamentais para Conseguir-Sobreviver-Numa-Sociedade-de-Nadas. Uma sabedoria instantânea, teórica, planeada, revolucionária, que se revelou imprevisível quando amou mais o Afonso que a ela no seu auge de esplendor, de verdade, de luz.
O encanto da Eva ressoará nos trilhos do tempo para sempre. A sua história só será completa e turbulenta quando na relatividade do que é o Amor imóvel, fechado e derradeiro, se fizer uma alusão clara, maciça e pura aos Afonsos miseráveis e vitoriosos que se orgulham de nunca terem amado.
Experimentei afastar-me. Pertencer-me só a mim. Mas não consegui. A Eva não é minha. Eu é que sou dela. Não no sentido de posse, de exaltação estonteante, de prazer sobejo ou carnal. Trata-se apenas de uma dependência que me desarrumou a vida. Um mexer e remexer de gavetas, de sonhos e de desejos em que me embaracei do princípio ao fim.
Organizei a minha vida, o meu espírito alheio e irritado, as aulas de Português que lecciono na faculdade, os meus quarenta e seis anos, os (in)contestáveis charutos, a adequação cintilante e enigmática do meu humor – ou amor – à Eva. Vivo em função dela. Não como amante. Mas como minha filha. Minha amiga incontornável e duradoura. Conformada e magnânime.
Será assim tão difícil perceber que eu amo apenas a Eva triste, desiludida, morta, diminuída, perdida? Nada mais. Sou apenas um amigo dos maus momentos. Trato-lhe da alma estilhaçada e exausta como quem cura uma ferida. Uma chaga incicatrizável. O Afonso.
"Francisco, incomodas-te se eu ficar a dormir cá esta noite? Tenho medo de voltar a sonhar com o Afonso." E eu aceno com a cabeça afirmativamente e nego com o coração. Ela tem de aprender a lutar contra esse fantasma que tanto a aterroriza e que tanto ama. Mas não posso prescindir dela, como ela não conseguirá jamais se desvincular do Afonso. É o seu fado. A sua sina. E ela já se conformou com isso. Como se não houvesse remédio, como se tivesse sido crucificada por prazer, como se estivesse disposta a profanar internamente as golfadas de dor que a fazem esmorecer.
Ela assume que o Afonso é uma doença. Que necessita de uma cura delicada e violenta, interna e inquebrantável. Um processo irreversível que eu sei que ela não vai iniciar nunca.
Viciei-me nela. Não posso negar. Viciei-me nas lágrimas pacíficas que derrama no sofá da minha casa porque nunca aprendeu a ser infeliz sozinha. Viciei-me nos gestos alinhados e vivos dos seus dedos enigmáticos. Viciei-me na sua vida povoada de príncipes e princesas, de fadas invisíveis e bailarinas sumptuosas.
Ela é uma criança. Uma mulher que quer para sempre ter quinze anos. Essa idade liga-a ao passado e, por conseguinte, ao homem que tão delicadamente a decompõe numa tristeza estereofónica e medíocre.
Ela inspira-me. Inspira a minha vida esborratada e deserta. Uma vida que não magoa, mas fere.
A Eva ressuscitou-me. Ajustei a minha existência à dela e não conseguirei em momento algum desprender-me deste deslumbramento gentilmente cedido por um eventual e altruísta Destino.
Amansou-me a idade e o espírito. Já não tenho medo de envelhecer, de morrer. A morte torturava-me e a Eva oferece-me o alívio dos afectos e do choro alheado que eu não pressenti nem causei. Ela vive em constante remodelação interior e não é capaz de enterrar o seu maior inimigo.
Adquiriu todas as habilidades necessárias e fundamentais para Conseguir-Sobreviver-Numa-Sociedade-de-Nadas. Uma sabedoria instantânea, teórica, planeada, revolucionária, que se revelou imprevisível quando amou mais o Afonso que a ela no seu auge de esplendor, de verdade, de luz.
O encanto da Eva ressoará nos trilhos do tempo para sempre. A sua história só será completa e turbulenta quando na relatividade do que é o Amor imóvel, fechado e derradeiro, se fizer uma alusão clara, maciça e pura aos Afonsos miseráveis e vitoriosos que se orgulham de nunca terem amado.
Experimentei afastar-me. Pertencer-me só a mim. Mas não consegui. A Eva não é minha. Eu é que sou dela. Não no sentido de posse, de exaltação estonteante, de prazer sobejo ou carnal. Trata-se apenas de uma dependência que me desarrumou a vida. Um mexer e remexer de gavetas, de sonhos e de desejos em que me embaracei do princípio ao fim.
Organizei a minha vida, o meu espírito alheio e irritado, as aulas de Português que lecciono na faculdade, os meus quarenta e seis anos, os (in)contestáveis charutos, a adequação cintilante e enigmática do meu humor – ou amor – à Eva. Vivo em função dela. Não como amante. Mas como minha filha. Minha amiga incontornável e duradoura. Conformada e magnânime.
Será assim tão difícil perceber que eu amo apenas a Eva triste, desiludida, morta, diminuída, perdida? Nada mais. Sou apenas um amigo dos maus momentos. Trato-lhe da alma estilhaçada e exausta como quem cura uma ferida. Uma chaga incicatrizável. O Afonso.
"Francisco, incomodas-te se eu ficar a dormir cá esta noite? Tenho medo de voltar a sonhar com o Afonso." E eu aceno com a cabeça afirmativamente e nego com o coração. Ela tem de aprender a lutar contra esse fantasma que tanto a aterroriza e que tanto ama. Mas não posso prescindir dela, como ela não conseguirá jamais se desvincular do Afonso. É o seu fado. A sua sina. E ela já se conformou com isso. Como se não houvesse remédio, como se tivesse sido crucificada por prazer, como se estivesse disposta a profanar internamente as golfadas de dor que a fazem esmorecer.
Ela assume que o Afonso é uma doença. Que necessita de uma cura delicada e violenta, interna e inquebrantável. Um processo irreversível que eu sei que ela não vai iniciar nunca.
15.7.09
3.
A Maria Eduarda acabou de me ligar. A perguntar se eu estava bem. Porque é que eu deveria estar mal? Convenhamos que ver o Afonso, pensar no Afonso, falar com e do Afonso não me faz lá muito bem ao juízo, melhor dizendo, ao coração. Mas agora eu tenho o Tomás e estou feliz. Infinitamente feliz.
Felicidade. Amor. Paixão. Cumplicidade. Palavras que eu vejo associadas ao Afonso. Ao meu Afonso. Ao príncipe que virou sapo. À pessoa que mais me fez sofrer. Rectifico, me faz sofrer. Até hoje. Para sempre.
Conheci-o tinha eu quinze anos. Ele era mais velho e as minhas amigas suspiravam todas por ele. Enlouqueciam, matavam-se umas às outras só para ter a possibilidade de estar a dois metros de distância. Eu não. Achava-o um pouco presunçoso, frio demais, um narcisista metido a galã de novela das nove. E os amigos então… um bando de miúdos que já se achavam uns homens, com cara de gafanhotos e voz de cana rachada, que passavam o tempo a tentar conquistar raparigas mais velhas e a gozar sarcasticamente com as mais novas. Uns completos idiotas, excluindo o Gui. Não sei como o Afonso os suportava!
Um dia, tinha eu entrado em crise – desde de pequena que isto me acontece – e resolvi ir para o cais, junto ao rio. O rio que me ligará eternamente ao oceano de amor que sinto e sentirei pelo Afonso. O nosso rio. Precisava de o inundar de lágrimas para ver se matava a angústia que me apertava o peito e parecia me consumir de dor e emoção. E ele apareceu. Como surgido do nada. Como se tivesse nascido naquele momento para me fazer renascer a mim também. Como se o destino o tivesse conduzido até àquele lugar.
Duas palavras bastaram para que eu me apaixonasse. "Por aqui?". Não foi propriamente amor à primeira vista, mas eu digo sempre à Eduarda que sim. Afinal, foi a primeira vez que eu estive frente-a-frente, coração-a-coração com um Afonso que era tudo menos excêntrico e egoísta.
Ele sentou-se ao meu lado. Emprestou-me a sua alma para que eu pudesse enxugar as lágrimas doces e apaixonadas. Conheci e apaixonei-me por um Afonso que nunca ninguém descobriu. Só eu, num fim de tarde de Junho, à beira de um rio que parecia abraçar o sol, perto de um homem que me secou as lágrimas, para mais tarde as fazer brotar. Com mais intensidade. Com mais sofrimento. Sem que nada o fizesse prever. Sem que eu pudesse compreender porquê. Abri-lhe o meu coração como se fosse um livro, mostrei-lhe a minha vida como se fosse uma exposição de pintura de Arte Nova, contei-lhe os meus segredos como se fossem pérolas ostracizadas no fundo do mar. E amei-o. Como nunca vou conseguir amar ninguém. Ele foi o primeiro e será o único homem da minha vida. Porque ninguém nunca apagará a nossa história, a minha vida. Nem o tempo. Nem a morte. Muito menos a eternidade.
Amar o Afonso foi incrível, continua-lo a amar é terrível. Depois de tudo o que aconteceu. Depois de ele se ter afundado no meu coração e de lá nunca mais poder sair. Depois de lhe ter oferecido a minha alma e de ele me ter dado a rejeição e a distância sentimental que eu não merecia. As quais o Tomás também não merece. O Tomás. Ama-me. Diz ele. E eu tenho de tentar ama-lo também. Vou ter de corresponder a esse amor que surgiu do nada e que agora é tudo o que tenho.
O Afonso? Continuará a ser uma amarga e quente lembrança do amor que construí. Por cima de tristeza, de negação, de alicerces frágeis e deteriorados. Por cima de um sentimento único que o Afonso jamais compreenderá. Nem homem nenhum. Amar só os fortes e corajosos conseguem. Fugir do amor apenas os fracos têm capacidade. Pois têm medo. Medo de serem felizes.
Quando era pequena amava as Barbies, os Power Rangers, e uma boneca gorducha e fofa que adormecia ao meu lado todas as noites. Dizem os especialistas que gostámos mais das coisas que interagem connosco frequentemente. Mas eu não acredito. Amamos, sim, as pessoas que estão mais afastadas de nós, que nos ignoram e maltratam. Amamos as coisas que não possuímos e detestamo-las quando se tornam fáceis de alcançar. Demasiadamente acessíveis. Há um prazer enorme em acolher o proibido, em dialogar com o que está irremediavelmente longe. Muito longe. Aprendi isto depois de conhecer o Afonso. Depois de o ter perdido é que o meu amor se tornou ainda mais intenso. Ainda mais insuportável. Ainda mais insuperável.
O Tomás é um querido. Mas eu já o tenho. Já o possuo. Não há mais nada a fazer. Acabou o prazer da conquista. Acabaram os segredos e os sorrisos sedutores. Acabou nele a água de que eu precisava para continuar a viver. A banalidade bateu à porta, mas eu não a quero deixar já entrar. O Tomás ainda não pode ir embora. Preciso dele mais do que nunca, por isso, vou lutar e fazer com que o nosso namoro se fortifique com o carinho e a doçura dos seus olhos. Pode não ser igual ao Afonso, mas está comigo quando preciso. Não vai fugir nunca. Ele é meu e vou quere-lo sempre ao meu lado. Mesmo quando tiver de sair do meu mundo. Não é que ele seja pequenino. O problema é que eu o construí quando estava com o Afonso, e homem nenhum cabe nestes moldes. O Tomás tem-se aguentado, mas talvez por pouco tempo. Com ou sem rotina. Por mais repetitivos que sejam os gestos, as palavras, tudo vale mais que o silêncio. E eu não suporto a solidão. Não é que vá ficar sozinha. Sei que a super protecção da Maria Eduarda, o fascínio do Gui, a sensibilidade da Bia e a tranquilidade do meu velho e justo amigo Francisco me irão acompanhar eternamente. Até ao fim do interminável. Até sempre.
A amizade não é frágil e insegura como o amor. Ela não depende de dois corpos nem de duas almas. Apenas de um coração vigoroso ou solitário, estimado ou incompetente, morto ou imprevisível, espirituoso ou desemparelhado.
Felicidade. Amor. Paixão. Cumplicidade. Palavras que eu vejo associadas ao Afonso. Ao meu Afonso. Ao príncipe que virou sapo. À pessoa que mais me fez sofrer. Rectifico, me faz sofrer. Até hoje. Para sempre.
Conheci-o tinha eu quinze anos. Ele era mais velho e as minhas amigas suspiravam todas por ele. Enlouqueciam, matavam-se umas às outras só para ter a possibilidade de estar a dois metros de distância. Eu não. Achava-o um pouco presunçoso, frio demais, um narcisista metido a galã de novela das nove. E os amigos então… um bando de miúdos que já se achavam uns homens, com cara de gafanhotos e voz de cana rachada, que passavam o tempo a tentar conquistar raparigas mais velhas e a gozar sarcasticamente com as mais novas. Uns completos idiotas, excluindo o Gui. Não sei como o Afonso os suportava!
Um dia, tinha eu entrado em crise – desde de pequena que isto me acontece – e resolvi ir para o cais, junto ao rio. O rio que me ligará eternamente ao oceano de amor que sinto e sentirei pelo Afonso. O nosso rio. Precisava de o inundar de lágrimas para ver se matava a angústia que me apertava o peito e parecia me consumir de dor e emoção. E ele apareceu. Como surgido do nada. Como se tivesse nascido naquele momento para me fazer renascer a mim também. Como se o destino o tivesse conduzido até àquele lugar.
Duas palavras bastaram para que eu me apaixonasse. "Por aqui?". Não foi propriamente amor à primeira vista, mas eu digo sempre à Eduarda que sim. Afinal, foi a primeira vez que eu estive frente-a-frente, coração-a-coração com um Afonso que era tudo menos excêntrico e egoísta.
Ele sentou-se ao meu lado. Emprestou-me a sua alma para que eu pudesse enxugar as lágrimas doces e apaixonadas. Conheci e apaixonei-me por um Afonso que nunca ninguém descobriu. Só eu, num fim de tarde de Junho, à beira de um rio que parecia abraçar o sol, perto de um homem que me secou as lágrimas, para mais tarde as fazer brotar. Com mais intensidade. Com mais sofrimento. Sem que nada o fizesse prever. Sem que eu pudesse compreender porquê. Abri-lhe o meu coração como se fosse um livro, mostrei-lhe a minha vida como se fosse uma exposição de pintura de Arte Nova, contei-lhe os meus segredos como se fossem pérolas ostracizadas no fundo do mar. E amei-o. Como nunca vou conseguir amar ninguém. Ele foi o primeiro e será o único homem da minha vida. Porque ninguém nunca apagará a nossa história, a minha vida. Nem o tempo. Nem a morte. Muito menos a eternidade.
Amar o Afonso foi incrível, continua-lo a amar é terrível. Depois de tudo o que aconteceu. Depois de ele se ter afundado no meu coração e de lá nunca mais poder sair. Depois de lhe ter oferecido a minha alma e de ele me ter dado a rejeição e a distância sentimental que eu não merecia. As quais o Tomás também não merece. O Tomás. Ama-me. Diz ele. E eu tenho de tentar ama-lo também. Vou ter de corresponder a esse amor que surgiu do nada e que agora é tudo o que tenho.
O Afonso? Continuará a ser uma amarga e quente lembrança do amor que construí. Por cima de tristeza, de negação, de alicerces frágeis e deteriorados. Por cima de um sentimento único que o Afonso jamais compreenderá. Nem homem nenhum. Amar só os fortes e corajosos conseguem. Fugir do amor apenas os fracos têm capacidade. Pois têm medo. Medo de serem felizes.
Quando era pequena amava as Barbies, os Power Rangers, e uma boneca gorducha e fofa que adormecia ao meu lado todas as noites. Dizem os especialistas que gostámos mais das coisas que interagem connosco frequentemente. Mas eu não acredito. Amamos, sim, as pessoas que estão mais afastadas de nós, que nos ignoram e maltratam. Amamos as coisas que não possuímos e detestamo-las quando se tornam fáceis de alcançar. Demasiadamente acessíveis. Há um prazer enorme em acolher o proibido, em dialogar com o que está irremediavelmente longe. Muito longe. Aprendi isto depois de conhecer o Afonso. Depois de o ter perdido é que o meu amor se tornou ainda mais intenso. Ainda mais insuportável. Ainda mais insuperável.
O Tomás é um querido. Mas eu já o tenho. Já o possuo. Não há mais nada a fazer. Acabou o prazer da conquista. Acabaram os segredos e os sorrisos sedutores. Acabou nele a água de que eu precisava para continuar a viver. A banalidade bateu à porta, mas eu não a quero deixar já entrar. O Tomás ainda não pode ir embora. Preciso dele mais do que nunca, por isso, vou lutar e fazer com que o nosso namoro se fortifique com o carinho e a doçura dos seus olhos. Pode não ser igual ao Afonso, mas está comigo quando preciso. Não vai fugir nunca. Ele é meu e vou quere-lo sempre ao meu lado. Mesmo quando tiver de sair do meu mundo. Não é que ele seja pequenino. O problema é que eu o construí quando estava com o Afonso, e homem nenhum cabe nestes moldes. O Tomás tem-se aguentado, mas talvez por pouco tempo. Com ou sem rotina. Por mais repetitivos que sejam os gestos, as palavras, tudo vale mais que o silêncio. E eu não suporto a solidão. Não é que vá ficar sozinha. Sei que a super protecção da Maria Eduarda, o fascínio do Gui, a sensibilidade da Bia e a tranquilidade do meu velho e justo amigo Francisco me irão acompanhar eternamente. Até ao fim do interminável. Até sempre.
A amizade não é frágil e insegura como o amor. Ela não depende de dois corpos nem de duas almas. Apenas de um coração vigoroso ou solitário, estimado ou incompetente, morto ou imprevisível, espirituoso ou desemparelhado.
14.7.09
2.
Estou farto da Sofia. Já não a suporto. Só pensa em moda, em saídas com as amigas, em festas, em jantares. Não sei onde é que eu estava com a cabeça ao assumir este namoro. Bem, sempre é melhor que a outra doida que se apoderou do meu coração quando eu era um pós-adolescente confuso e rebelde que achava, e continuo a achar, que o amor é uma ilusão. Isso sim teria sido um erro. A Sofia, pelo menos, não me pede amor, só dinheiro e companhia. Podia ser pior. Mas agora, está cada vez mais irritante. A voz dela incomoda-me, a maneira de ser também. As mulheres são mesmo terríveis. Ou pensam em paixões ou em viagens. Ou querem um homem ou um anel. Enquanto a Sofia me for apenas pedindo casacos, malas, colares, perfumes e todas aqueles bens materiais supérfluos que a fazem ser tão feliz, aguento-a.
A "borboleta" não era assim. Ela amava-me puramente. Fosse eu rico, pobre, aleijado, maltrapilho. Mas o que é que me deu para pensar nela? E ainda por cima chamei-a de BORBOLETA… Não estou bem. Depois de nove anos ainda continuo a trata-la como antigamente. Noutro dia encontrei-a. Estava maravilhosa. Com um jeans justinhos da D&G e uma blusa de seda preta discretamente decotada que lhe ficava a matar. E claro, os sapatos... dourados a condizer com a mala. Chiquíssima. Uma vez, ouvi a Maria Eduarda comentar que nunca tinha conhecido ninguém que gostasse tanto de sapatos como a prima. Não é que me tenha interessado a conversa, mas por vezes é bom escutar um pouco as mulheres para ver se entendemos melhor o seu mundo, ou se ficamos ainda mais confusos. Ia a casa do Gui e da Eduarda. Estava à espera do elevador e ela saiu de dentro dele. Como se fosse um presente a sair de uma caixa gigante delicadamente embrulhada. E sorriu. Com os olhos, com a boca, com o coração. Nunca vi um sorriso tão mágico em toda a minha vida. E disse-me "olá!" com aquela vez melódica que parece ter saído de uma caixinha de música de embalar. Ou melhor, de encantar. Mas ela já não deve pensar em mim. Ouvi a Eduarda dizer, por acaso claro, que a Eva namorava com o Tomás Albuquerque, um jornalista cheio de fama, sucesso e dinheiro. E ela parecia-me realmente feliz quando saiu do elevador e entrou de novo no meu coração. Mas o que é que eu estou para aqui a dizer? A Eva nem mulher nenhuma conseguirão desarrumar a minha vida. Estou bem assim. Muito bem.
Depois de ela ter desaparecido pela porta do prédio, a deslizar como se fosse um cisne e o chão um bonito e transparente lago azul, entrei no elevador. O perfume dela estava deliciosamente concentrado no elevador e por momentos comecei a sonhar. Ela dançava num palco gigantesco, vestida de bailarina. E voava. Bem alto. Muito alto. Eu estava na assistência, sozinho, e, de repente, sentia uma força que me sugava, que me levava até ela. E comecei a voar ao seu lado. Ao lado da Eva. Ao lado da única miúda que eu amei em toda a minha vida. Mas que perdi. Que afastei, que magoei. Tudo porque não tenho medo de arriscar na Bolsa mas tive um receio tremendo de amar. Perdi a Eva tinha eu dezoito anos. Nunca tive coragem de dizer a ninguém que estava apaixonado por ela. Os meus amigos achavam-na uma menina mimada. Diziam isso porque nunca conheceram a Eva que eu tive o prazer ou o azar de descobrir. Nem ao Gui eu contei.
Quero que a Eva continue afogada no meu sangue, dentro de mim e que pare de me consumir a alma, para não me destruir novamente o coração.
Eu e o Guilherme nunca falamos da Eva. Só ele da Eduarda e eu da Sofia e dos meus affairs. Falar da Eva deve-me fazer tão mal como pensar nela. E o pior é que penso nela todas as noites, a quase todas as horas. Mas é um segredo que eu pretendo guardar só para mim. Apenas dentro de mim ela continua a existir e é assim que deve ser.
Depois de tocar à campainha e de entrar em casa do casal mais perfeito que conheço, a Maria Eduarda perguntou-me num tom de voz preocupado se eu me tinha cruzado com a Eva. Depois de ter respondido afirmativamente ela pegou no telemóvel e afastou-se com um ar ainda mais estranho. Não percebi porque, mas também não quis perguntar. A Eva faz-me mal.
E acabaram os pensamentos nela assim que o Gui me começou a falar de um novo projecto da empresa. O trabalho é um bom escape. O único que eu encontrei para esquecer a minha Borboleta.
A "borboleta" não era assim. Ela amava-me puramente. Fosse eu rico, pobre, aleijado, maltrapilho. Mas o que é que me deu para pensar nela? E ainda por cima chamei-a de BORBOLETA… Não estou bem. Depois de nove anos ainda continuo a trata-la como antigamente. Noutro dia encontrei-a. Estava maravilhosa. Com um jeans justinhos da D&G e uma blusa de seda preta discretamente decotada que lhe ficava a matar. E claro, os sapatos... dourados a condizer com a mala. Chiquíssima. Uma vez, ouvi a Maria Eduarda comentar que nunca tinha conhecido ninguém que gostasse tanto de sapatos como a prima. Não é que me tenha interessado a conversa, mas por vezes é bom escutar um pouco as mulheres para ver se entendemos melhor o seu mundo, ou se ficamos ainda mais confusos. Ia a casa do Gui e da Eduarda. Estava à espera do elevador e ela saiu de dentro dele. Como se fosse um presente a sair de uma caixa gigante delicadamente embrulhada. E sorriu. Com os olhos, com a boca, com o coração. Nunca vi um sorriso tão mágico em toda a minha vida. E disse-me "olá!" com aquela vez melódica que parece ter saído de uma caixinha de música de embalar. Ou melhor, de encantar. Mas ela já não deve pensar em mim. Ouvi a Eduarda dizer, por acaso claro, que a Eva namorava com o Tomás Albuquerque, um jornalista cheio de fama, sucesso e dinheiro. E ela parecia-me realmente feliz quando saiu do elevador e entrou de novo no meu coração. Mas o que é que eu estou para aqui a dizer? A Eva nem mulher nenhuma conseguirão desarrumar a minha vida. Estou bem assim. Muito bem.
Depois de ela ter desaparecido pela porta do prédio, a deslizar como se fosse um cisne e o chão um bonito e transparente lago azul, entrei no elevador. O perfume dela estava deliciosamente concentrado no elevador e por momentos comecei a sonhar. Ela dançava num palco gigantesco, vestida de bailarina. E voava. Bem alto. Muito alto. Eu estava na assistência, sozinho, e, de repente, sentia uma força que me sugava, que me levava até ela. E comecei a voar ao seu lado. Ao lado da Eva. Ao lado da única miúda que eu amei em toda a minha vida. Mas que perdi. Que afastei, que magoei. Tudo porque não tenho medo de arriscar na Bolsa mas tive um receio tremendo de amar. Perdi a Eva tinha eu dezoito anos. Nunca tive coragem de dizer a ninguém que estava apaixonado por ela. Os meus amigos achavam-na uma menina mimada. Diziam isso porque nunca conheceram a Eva que eu tive o prazer ou o azar de descobrir. Nem ao Gui eu contei.
Quero que a Eva continue afogada no meu sangue, dentro de mim e que pare de me consumir a alma, para não me destruir novamente o coração.
Eu e o Guilherme nunca falamos da Eva. Só ele da Eduarda e eu da Sofia e dos meus affairs. Falar da Eva deve-me fazer tão mal como pensar nela. E o pior é que penso nela todas as noites, a quase todas as horas. Mas é um segredo que eu pretendo guardar só para mim. Apenas dentro de mim ela continua a existir e é assim que deve ser.
Depois de tocar à campainha e de entrar em casa do casal mais perfeito que conheço, a Maria Eduarda perguntou-me num tom de voz preocupado se eu me tinha cruzado com a Eva. Depois de ter respondido afirmativamente ela pegou no telemóvel e afastou-se com um ar ainda mais estranho. Não percebi porque, mas também não quis perguntar. A Eva faz-me mal.
E acabaram os pensamentos nela assim que o Gui me começou a falar de um novo projecto da empresa. O trabalho é um bom escape. O único que eu encontrei para esquecer a minha Borboleta.
13.7.09
1.
A Eva está apaixonada. Mais uma vez.
Não é que eu não acredite neste novo romance, mas eu sei onde é que isto vai parar. Já estou habituada ao amor utópico que ela acredita sentir. Ela ama demais. O Afonso. Não este Tomás com cara de príncipe do século vinte e um, nem o totó do Miguel que andava com ela para fazer ciúmes à ex-namorada, nem aquele tal de André que se achava o máximo e na realidade só tinha um palmo de cara e nem uma unha de inteligência, nem todos os outros com quem ela namorou para esquecer o bendito Afonso cujo nome jamais deve ser pronunciado diante dela. Se não, é depressão na certa.
A Eva sempre foi assim. Desde criança. Quando no Natal a família se juntava e ao nosso redor só parecia existir alegria ela ia para o quarto chorar. Mesmo que tivesse recebido o presente que desejara, mesmo que tivesse visto uma comédia hilariante daquelas que nos fazem rir ainda no dia seguinte. Parece surreal, mas ela nunca foi feliz. Só quando se apaixonou pelo Afonso, pelo menos é o que ela diz.
De todos os primos e primas que tenho ela sempre foi a minha preferida. Há sempre uma prima preferida e a Eva desde cedo foi a minha. Talvez por ser psicologicamente tão frágil. Talvez por sempre ter desejado ter uma irmã mais nova. Talvez por ser incrivelmente linda, meiga, inteligente e profissionalmente bem sucedida como se costuma dizer quando se vê alguém num Mercedes cabriolet, com roupas que fazem sobressair um corpo divinal e uma conta bancária daquelas com uma infinidade de zeros. Uma mulher de sonho, como diz o Guilherme. O meu namorado. Ou marido. Ou companheiro. Tanto faz. Ainda não percebi bem a diferença. Vivemos juntos há quatro anos e somos um casal feliz como suspira a Eva quando entra cá em casa à procura de um ombro onde possa afagar a alma e o coração, depois de por fim a uma relação e de entrar numa daquelas crises que podem durar horas, dias, meses e no caso do tal Cujo-Nome-Não-Se-Pode-Pronunciar nove anos. É de loucos. Por vezes, nem eu acredito como pode alguém amar um homem há nove anos e não lutar por ele, não fazer nada. Só chorar e esperar que ele volte. Se eu não a tivesse visto sofrer tanto pelo Afonso acharia que tudo não passa de um capricho como diz o Guilherme. Mas é muito mais que isso. Nove anos a sofrer… só quem é masoquista e a Eva, por vezes, parece.
A minha prima é mesmo muito louca. Pode ter tudo o que quer. Qualquer coisa. Desde a mais simples à mais extravagante e foi logo gostar do Afonso. Não é que ele seja mau rapaz. Muito pelo contrário. Mas também não é nenhum santo. Somos amigos e ele e o Guilherme adoram-se. Jogam ténis os dois, trabalham na mesma empresa e jantamos tantas vezes juntos que, às vezes, me passo com a quantidade de miúdas diferentes que ele leva e apresenta como “uma amiga lá do escritório”. Está-se mesmo a ver que elas não sabem que por trás da carinha de anjo de olhos verdes está um lobo mau prontinho para atacar. E a Sofia em casa ou no cinema com aquelas amigas dela, com ar de gente importante, que vivem às custas dos maridos e que estão habituadas apenas a trabalhar os olhos no centro comercial.
– Não é que ele faça por mal – defende-o o Guilherme. Os homens são mesmo todos iguais! Encobrem os pecados uns dos outros e acham que é normal usar as mulheres de acordo com as suas conveniências e desejos.
– Não Gui, faz por bem claro! Como é que eu não imaginei isso antes!
– Não sejas irónica Maria Eduarda. A culpa é de uma miúda que ele conheceu quando tinha dezoito anos. Ele nunca me explicou a história, mas sei que foi a única mulher que ele amou.
Pobre Guilherme, acredita em cada coisa. O Afonso apaixonado de verdade! Daqui a pouco diz-me que na vida passada foi o rei Artur e que o amigo era um dos cavaleiros da tábua redonda!
O telemóvel está a tocar. É a Eva. Aposto a minha escultura nova, que segundo o Guilherme é das mais bonitas que fiz até hoje, que ela me vai dizer que finalmente encontrou o homem certo, que o Tomás é extraordinário, que já nem imagina a vida dela sem ele.
– Olá Eduarda! – Eu não disse? A voz dela não me engana! Está momentaneamente feliz!
– Olá querida! Tá tudo bem contigo? E com o Tomás?
– Estamos óptimos. Tenho uma novidade fantástica e quero que sejas a primeira pessoas a saber.
Não acredito. A coisa é mais séria do que eu imaginei. Ainda me vai dizer que resolveu casar-se…
– Fui convidada para ser directora de uma grande empresa de cosmética. E o melhor… a sede é no Brasil!! Não sei se tás a ver bem? Um salário astronómico, um país maravilhoso e a distância… Longe de Portugal vou conseguir aquela tal felicidade absoluta que eu procuro há anos… desde sempre!
– Mas e então o Tomás, os teus amigos, eu?
– Eu tou feliz Eduarda! Não é isso o mais importante?
Ela tem razão. O que interessa é a felicidade dela. Mas quem é que a vai consolar quando tiver um pesadelo com o Afonso e lhe apetecer bater à porta de alguém às quatro da manhã, de pijama e com os olhos tão inchados que até dá dó? Quem é que vai ter paciência para a ouvir contar, com um entusiasmo quente e doce, que encontrou o amor inesperadamente numa daquelas ruas pelas quais ela adora passear “para estar perto da realidade, porque os toxicodependentes e as mulheres da vida existem”?
Ela não regula lá muito bem. Cada vez tenho mais certeza disso. Agora vai para o Brasil. Para longe de tudo. De todos. Do único suporte afectivo sólido que ela conseguiu construir.
Nunca a imaginei afastada de mim. É, a Eva dá um sabor de loucura e de ternura à minha vida. Agora já não vou ter ninguém de quem cuidar carinhosamente e fazer sermões prolongados e docemente cansativos. Ela precisa de sentir que alguém está aqui para a ajudar, sempre. As preocupações com ela vão continuar, é certo, mas a imensas milhas de distância. Do outro lado do oceano. Só espero que esta nova etapa a invada de tranquilidade e alegria, que é o que ela mais precisa. Que é o que todos nós precisamos. Não digo de amor porque isso a Eva tem e dá de sobra. Dará sempre. Mesmo que sofra. Mesmo que a façam sofrer. Ela ama mais o amor que os objectos, que as pessoas. Só com o Afonso é que as coisas são diferentes. Nunca percebi de onde surgiu aquele sentimento infinito que ela diz sentir por ele. Mas é sincero. Pelo menos é que eu acho.
Porque é que amamos tanto quem não nos respeita nem sequer gosta de nós como queríamos que gostasse?
Com o Guilherme eu não tenho esse tipo de problemas. Não foi amor à primeira vista, porque não acredito nesse tipo de coisas como a Eva, mas talvez ao primeiro beijo, ao primeiro encontro, depois de termos conversado muito e nos conhecido profundamente. Completamo-nos. Ele é a minha metade da laranja, a tal alma gémea que tão raramente temos a sorte de encontrar. Mas eu não dependo dele. Sinto-me livre. Sempre gostei de ser independente. E enquanto este amor durar vou acreditar que é eterno. Porque sei que nada dura para sempre. Nada. Por isso, vivo sempre o agora, o hoje, para que se perpetue para sempre no amanhã através do meu coração. Através das recordações. Boas e más.
Não é que eu não acredite neste novo romance, mas eu sei onde é que isto vai parar. Já estou habituada ao amor utópico que ela acredita sentir. Ela ama demais. O Afonso. Não este Tomás com cara de príncipe do século vinte e um, nem o totó do Miguel que andava com ela para fazer ciúmes à ex-namorada, nem aquele tal de André que se achava o máximo e na realidade só tinha um palmo de cara e nem uma unha de inteligência, nem todos os outros com quem ela namorou para esquecer o bendito Afonso cujo nome jamais deve ser pronunciado diante dela. Se não, é depressão na certa.
A Eva sempre foi assim. Desde criança. Quando no Natal a família se juntava e ao nosso redor só parecia existir alegria ela ia para o quarto chorar. Mesmo que tivesse recebido o presente que desejara, mesmo que tivesse visto uma comédia hilariante daquelas que nos fazem rir ainda no dia seguinte. Parece surreal, mas ela nunca foi feliz. Só quando se apaixonou pelo Afonso, pelo menos é o que ela diz.
De todos os primos e primas que tenho ela sempre foi a minha preferida. Há sempre uma prima preferida e a Eva desde cedo foi a minha. Talvez por ser psicologicamente tão frágil. Talvez por sempre ter desejado ter uma irmã mais nova. Talvez por ser incrivelmente linda, meiga, inteligente e profissionalmente bem sucedida como se costuma dizer quando se vê alguém num Mercedes cabriolet, com roupas que fazem sobressair um corpo divinal e uma conta bancária daquelas com uma infinidade de zeros. Uma mulher de sonho, como diz o Guilherme. O meu namorado. Ou marido. Ou companheiro. Tanto faz. Ainda não percebi bem a diferença. Vivemos juntos há quatro anos e somos um casal feliz como suspira a Eva quando entra cá em casa à procura de um ombro onde possa afagar a alma e o coração, depois de por fim a uma relação e de entrar numa daquelas crises que podem durar horas, dias, meses e no caso do tal Cujo-Nome-Não-Se-Pode-Pronunciar nove anos. É de loucos. Por vezes, nem eu acredito como pode alguém amar um homem há nove anos e não lutar por ele, não fazer nada. Só chorar e esperar que ele volte. Se eu não a tivesse visto sofrer tanto pelo Afonso acharia que tudo não passa de um capricho como diz o Guilherme. Mas é muito mais que isso. Nove anos a sofrer… só quem é masoquista e a Eva, por vezes, parece.
A minha prima é mesmo muito louca. Pode ter tudo o que quer. Qualquer coisa. Desde a mais simples à mais extravagante e foi logo gostar do Afonso. Não é que ele seja mau rapaz. Muito pelo contrário. Mas também não é nenhum santo. Somos amigos e ele e o Guilherme adoram-se. Jogam ténis os dois, trabalham na mesma empresa e jantamos tantas vezes juntos que, às vezes, me passo com a quantidade de miúdas diferentes que ele leva e apresenta como “uma amiga lá do escritório”. Está-se mesmo a ver que elas não sabem que por trás da carinha de anjo de olhos verdes está um lobo mau prontinho para atacar. E a Sofia em casa ou no cinema com aquelas amigas dela, com ar de gente importante, que vivem às custas dos maridos e que estão habituadas apenas a trabalhar os olhos no centro comercial.
– Não é que ele faça por mal – defende-o o Guilherme. Os homens são mesmo todos iguais! Encobrem os pecados uns dos outros e acham que é normal usar as mulheres de acordo com as suas conveniências e desejos.
– Não Gui, faz por bem claro! Como é que eu não imaginei isso antes!
– Não sejas irónica Maria Eduarda. A culpa é de uma miúda que ele conheceu quando tinha dezoito anos. Ele nunca me explicou a história, mas sei que foi a única mulher que ele amou.
Pobre Guilherme, acredita em cada coisa. O Afonso apaixonado de verdade! Daqui a pouco diz-me que na vida passada foi o rei Artur e que o amigo era um dos cavaleiros da tábua redonda!
O telemóvel está a tocar. É a Eva. Aposto a minha escultura nova, que segundo o Guilherme é das mais bonitas que fiz até hoje, que ela me vai dizer que finalmente encontrou o homem certo, que o Tomás é extraordinário, que já nem imagina a vida dela sem ele.
– Olá Eduarda! – Eu não disse? A voz dela não me engana! Está momentaneamente feliz!
– Olá querida! Tá tudo bem contigo? E com o Tomás?
– Estamos óptimos. Tenho uma novidade fantástica e quero que sejas a primeira pessoas a saber.
Não acredito. A coisa é mais séria do que eu imaginei. Ainda me vai dizer que resolveu casar-se…
– Fui convidada para ser directora de uma grande empresa de cosmética. E o melhor… a sede é no Brasil!! Não sei se tás a ver bem? Um salário astronómico, um país maravilhoso e a distância… Longe de Portugal vou conseguir aquela tal felicidade absoluta que eu procuro há anos… desde sempre!
– Mas e então o Tomás, os teus amigos, eu?
– Eu tou feliz Eduarda! Não é isso o mais importante?
Ela tem razão. O que interessa é a felicidade dela. Mas quem é que a vai consolar quando tiver um pesadelo com o Afonso e lhe apetecer bater à porta de alguém às quatro da manhã, de pijama e com os olhos tão inchados que até dá dó? Quem é que vai ter paciência para a ouvir contar, com um entusiasmo quente e doce, que encontrou o amor inesperadamente numa daquelas ruas pelas quais ela adora passear “para estar perto da realidade, porque os toxicodependentes e as mulheres da vida existem”?
Ela não regula lá muito bem. Cada vez tenho mais certeza disso. Agora vai para o Brasil. Para longe de tudo. De todos. Do único suporte afectivo sólido que ela conseguiu construir.
Nunca a imaginei afastada de mim. É, a Eva dá um sabor de loucura e de ternura à minha vida. Agora já não vou ter ninguém de quem cuidar carinhosamente e fazer sermões prolongados e docemente cansativos. Ela precisa de sentir que alguém está aqui para a ajudar, sempre. As preocupações com ela vão continuar, é certo, mas a imensas milhas de distância. Do outro lado do oceano. Só espero que esta nova etapa a invada de tranquilidade e alegria, que é o que ela mais precisa. Que é o que todos nós precisamos. Não digo de amor porque isso a Eva tem e dá de sobra. Dará sempre. Mesmo que sofra. Mesmo que a façam sofrer. Ela ama mais o amor que os objectos, que as pessoas. Só com o Afonso é que as coisas são diferentes. Nunca percebi de onde surgiu aquele sentimento infinito que ela diz sentir por ele. Mas é sincero. Pelo menos é que eu acho.
Porque é que amamos tanto quem não nos respeita nem sequer gosta de nós como queríamos que gostasse?
Com o Guilherme eu não tenho esse tipo de problemas. Não foi amor à primeira vista, porque não acredito nesse tipo de coisas como a Eva, mas talvez ao primeiro beijo, ao primeiro encontro, depois de termos conversado muito e nos conhecido profundamente. Completamo-nos. Ele é a minha metade da laranja, a tal alma gémea que tão raramente temos a sorte de encontrar. Mas eu não dependo dele. Sinto-me livre. Sempre gostei de ser independente. E enquanto este amor durar vou acreditar que é eterno. Porque sei que nada dura para sempre. Nada. Por isso, vivo sempre o agora, o hoje, para que se perpetue para sempre no amanhã através do meu coração. Através das recordações. Boas e más.
Esta é uma história de amor simples.
Esta é uma história de amor.
Esta é uma história.
Era uma vez, uma história de amor simples. Deveriam ser todas just like that.
O amor é simples na sua essência, quando se torna complexo, não é amor. Não pode ser.
Esta é uma história de amor simples.
Mas eu não sei como começam as histórias simples de amor.
Esta é uma história de amor.
Esta é uma história.
Era uma vez, uma história de amor simples. Deveriam ser todas just like that.
O amor é simples na sua essência, quando se torna complexo, não é amor. Não pode ser.
Esta é uma história de amor simples.
Mas eu não sei como começam as histórias simples de amor.
11.7.09
10.7.09
9.7.09
Pronto, não consigo partir. . .
És parte de mim, da minha história, da minha vida. Contigo partilho lágrimas e pinto sorrisos. Não te vou deixar nunca mais. És mais de mim. Do que vivo ou desejo viver. Do que sonho ou desejo compreender.
Isto poderia ser uma declaração de amor para ele. Mas é para o meu, para o nosso blogue.
Voltei. Para sempre. Yeah!
Isto poderia ser uma declaração de amor para ele. Mas é para o meu, para o nosso blogue.
Voltei. Para sempre. Yeah!
8.7.09
4.7.09
3.7.09
"Querida, hoje veio-me uma enorme vontade de te amar e então pensei: vou-te escrever.
Mas não te quero amar no tempo em que te lembro, quero-te amar antes, muito antes... É quando o que é grande, acontece. O que é grande acontece no eterno e o amor é assim, devias saber.
Ama-se como se tem uma iluminação. Ou como quando se dá uma conjugação de astros no infinito, deve vir nos livros."
Mas não te quero amar no tempo em que te lembro, quero-te amar antes, muito antes... É quando o que é grande, acontece. O que é grande acontece no eterno e o amor é assim, devias saber.
Ama-se como se tem uma iluminação. Ou como quando se dá uma conjugação de astros no infinito, deve vir nos livros."
Vergílio Ferreira, Em Nome da Terra.
2.7.09
1.7.09
A wish
Para que os sonhos nunca se dissipem, para que a vida nunca nos deixe fraquejar, para que os abraços sejam contínuos e os sorrisos sinceros, para que o coração se encha de borboletas em todos os instantes, para que tudo seja simples e doce, para que a alma não se divida e a inspiração me faça voltar aqui, como antes. Para vocês. Por vocês.
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